terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Um quinto dos novos genéricos à espera dos tribunais

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Saúde
Um quinto dos novos genéricos à espera dos tribunais

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A guerra entre os fabricantes de genéricos (versões mais baratas dos medicamentos originais) e os laboratórios dos fármacos inovadores está ao rubro em Portugal. O problema intensificou-se em 2007 e atinge hoje uma dimensão inusitada: cerca de um quinto dos pedidos de definição de preços para genéricos apresentados este ano estão suspensos porque aguardam decisões dos tribunais.
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Resultado: há medicamentos (por exemplo para a doença de Alzheimer) que não começaram a ser comercializados por este motivo. E em 2009 já se adivinha uma luta judicial pelo fabrico do Viagra (ver texto ao lado).
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Em 2008, dos 500 pedidos de atribuição de preços para genéricos entrados na Direcção-Geral das Actividades Económicas (DGAE) cerca de 400 foram diferidos, e num prazo médio de oito dias, adianta o director-geral, Mário Lobo. Os restantes aguardam pelo desfecho das acções judiciais interpostas pelos fabricantes dos originais, que recorrem aos tribunais para defender as patentes.
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Em causa estará menos de uma dezena de moléculas (os pedidos são vários porque é necessário um para cada tipo de embalagem e dosagem), desvaloriza uma fonte da indústria farmacêutica.
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Mário Lobo adianta os dados de 2008 para provar que a entrada de genéricos não tem sido bloqueada em Portugal e contrariar as críticas da Comissão - que, num relatório preliminar de uma investigação sobre o sector divulgado há duas semanas, acusou as empresas de inovação de atrasar ou travar a entrada de genéricos interpondo acções judiciais, entre outro tipo de estratégias.
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O relatório destaca Portugal como um “case study” pelo elevado número de processos pendentes nos tribunais ("mais de 70"), e nota que por vezes as acções se arrastam tanto tempo que os fármacos caem, entretanto, no domínio público.
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"Em meados de 2008, o processo de aprovação de preço para 120 genéricos estava suspenso", refere o relatório. Segundo a autoridade nacional do medicamento (Infarmed), há 41 providências cautelares e 54 acções administrativas especiais pendentes.
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"Há muitos equívocos e ruídos" à volta desta questão, lamenta Lobo. "O que se verifica de diferente em Portugal é que os detentores das marcas entendem defender desta forma as suas patentes. E não sei se este fenómeno acontece mais cá porque haverá mais pedidos de entrada de genéricos."
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O presidente da Associação Portuguesa de Medicamentos Genéricos, Paulo Lilaia, contrapõe que o elevado número de casos se deve ao facto de, ao contrário de outros países na Europa, o processo ficar suspenso enquanto decorre a acção judicial.
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O problema é que este " bloqueio" resulta em elevados custos adicionais para os estados-membros e os contribuintes, acentua a CE. Analisando uma amostra de medicamentos que perderam a exclusividade entre 2000 e 2007 no conjunto dos vários países, a Comissão estima que teria sido possível poupar três mil milhões de euros se os genéricos tivessem entrado mais cedo no mercado.
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Forças de bloqueio?
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O processo de entrada implica duas etapas: primeiro é pedida uma autorização de introdução no mercado (AIM) ao Infarmed (que depende do Ministério da Saúde). Depois, é pedida a definição do preço à DGAE (dependente do Ministério da Economia e da Inovação). O que tem sucedido é que, mal o Infarmed concede as AIM, os laboratórios interpõem providências cautelares. E os genéricos não chegam ao mercado porque a DGAE fica a aguardar a decisão dos tribunais. O problema atingiu tal dimensão que motivou a intervenção do Governo: em Julho de 2007, o secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, Fernando Serrasqueiro, instou, por despacho, a DGAE a fixar o preço dos genéricos após as decisões judiciais. Face a protestos do sector, o despacho foi revogado e Serrasqueiro passou a matéria para a DGAE.
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Mário Lobo acrescenta que foi o Infarmed que decidiu, a partir de meados de 2007, dar sequência a todos os pedidos de AIM, obrigando a direcção-geral a ficar com "a decisão entre mãos". E nota que a maior parte das sentenças dos tribunais já conhecidas vão no sentido da suspensão da AIM, apesar de haver decisões divergentes quanto ao mesmo caso.
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Ao invés, o relatório da CE adianta que, das acções já decididas em tribunal entre 2000 e 2007, mais de 60 por cento foram favoráveis às empresas de genéricos. "A ideia de que as empresas de inovação estão a bloquear por bloquear está errada", defende a fonte da indústria farmacêutica, lamentando "a falta de ética" de empresas de genéricos, que avançam antes de as patentes expirarem.
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E dá o exemplo de várias moléculas para as quais já estão aprovadas AIM, como o valsartan (anti-hipertensor) e o valaciclovir (antiviral), mas cujas patentes só expirarão em 2013 e 2010. (Público)
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